A responsabilidade civil das academias e centro de práticas de atividades físicas – em caso de lesão de alunos, no treinamento ou em aulas de artes marciais – não chega a ser polêmica, mas certamente gera constantes dúvidas.
Afinal, ninguém se submete a prática de atividades físicas com objetivo de se machucar, ainda mais quando escolhe um local apropriado e com acompanhamento de profissionais presumidamente capacitados.
Entretanto, não são poucas as reclamações no sentido de buscar ressarcimento de despesas médicas (consultas e medicamentos), após sofrerem algum tipo de lesão em aulas de artes marciais, em academias e centros de atividades físicas.
A relação havida entre aluno e academia, sem dúvidas, amolda-se como de consumo, nos termos dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, aplicando-se, portanto, a responsabilidade objetiva – independentemente de culpa do estabelecimento comercial – para casos dessa natureza.
Observe-se, contudo, que apesar de haver responsabilidade do prestador de serviços é objetiva, mas deve haver comprovação subjetiva da culpa do professor que ministrava a aula de artes marciais, sob pena de inexistir dever de indenizar.
Ou seja, deve haver evidencia de culpa por parte da academia ou de seus preponentes, bem como a configuração do dano, somado ao nexo de causa entre a conduta comissiva ou omissiva da academia e o dano emergido, do contrário afasta-se a responsabilidade.
Vale esclarecer que o risco da lesão é inerente a qualquer atividade física e é aceito pelos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL, 1998) ao prelecionar o seguinte:
[…] a aprendizagem em Educação Física envolve alguns riscos do ponto de vista físico inerente ao próprio ato de se movimentar, como, por exemplo, nas situações em que o equilíbrio corporal é solicitado, a possibilidade de desequilíbrio estará inevitavelmente presente. Mesmo considerando que escorregões, pequenas trombadas, quedas, impactos de bolas e cordas não possam ser evitados por completo, cabe ao professor a tarefa de organizar situações de ensino e aprendizagem, de forma a minimizar esses pequenos acidentes. (BRASIL, 1997 p. 37).
Não há como correr, saltar, chutar e socar, sem incidir no risco de torcer um pé, escorregar, cair, tropeçar, etc, especialmente quando o incidente está inserido no âmbito das artes marciais, onde a exposição a esses riscos é ampliada.
A execução dos movimentos nas artes marciais demanda esforços corporais cada vez maiores, aumentando significativamente o risco de lesões: “quanto mais elevado for o nível do aluno, mais riscos surgem em função da complexidade dos movimentos” (NUNOMURA, Myrian. Segurança na ginástica olímpica. Revista Motriz, V.4 n.2, p. 106).
A prática de artes marciais tem como fato previsível e inevitável o contato físico, que não raras vezes expõe os seus praticantes a solavancos e quedas, sujeitando-os a sofrer algum tipo de lesão, como conseqüência natural desse tipo de atividade.
Isso acontece corriqueiramente nas academias, sem que tais fatos cheguem a desencadear ações reparatórias no Judiciário, até mesmo pelo fato de que, na quase totalidade dos casos, essas lesões não atingem a indesejadas e lamentáveis proporções.
Em conclusão, ao meu sentir, não se trata, propriamente, de fato do serviço, uma vez que o acidente não teve origem em defeito de sua prestação. Em verdade, trata-se de fato inerente à prática desse esporte que, por suas próprias características, infunde em todos que dele participam a consciência dos riscos de seu exercício.
Forte em tais razões, entendemos que não há responsabilidade da academia pelo evento, e consequentemente não há dever de indenizar.
José da Costa Valim Neto, especialista em Direito do Consumidor, Direito Médico, Direito Contratual e Responsabilidade Civil e sócio responsável departamento comercial na Valim Advogados Associados